O Fio de Ariana continuava com uma crise identitária. Como seu tutor, resolvi sentar-me à sua frente para termos uma conversa. Tentei explicar-lhe que, nesta idade, surgem dúvidas sobre tudo. Mas ele estava mesmo melancólico. Entre um Professorices e um recém-chegado Ensino Superior em Crise, sentia-se com a auto-estima em baixo. Procurei ajudá-lo e sugeri-lhe que falasse de algo que preocupasse os seus colegas da faculdade. O Fio saltou no ecrã e disse com entusiasmo: “-Já sei. Conseguir apontamentos emprestados e fotocópias.” Estava encontrado o tema do dia.
No meu tempo de estudante eu era um aluno que tirava muito poucos apontamentos nas aulas. Em alguns casos porque preferia ouvir o professor e tentar perceber a matéria, tomando nota de apenas alguns tópicos. Noutros, porque do que o professor dizia, em 2 horas de aulas, pouco de essencial se aproveitava. Mas a maior parte dos colegas tirava imensos apontamentos. Pareciam funcinários do tribunal. Quando chegava a altura dos exames, havia quem pedisse os apontamentos emprestados a esses colegas-escrivães. A maior parte estudava por apontamentos: pelos seus ou pelos de outro colega. Nas aulas, raramente alguém tinha dúvidas. Quando interrompiam o professor era para lhe pedir que repetisse o que tinha dito...
O certo é que, em algumas disciplinas, estudar pelos apontamentos dava muito bons resultados. Quando assim acontecia, eu tinha uma má surpresa na pauta... Como não tinha apontamentos, e cometia a heresia de fazer leituras, não poderia responder ao que o professor pretendia.
Ora, alguns colegas alcançavam os resultados necessários para passar de ano sem irem às aulas e sem lerem um único livro. E não estou a falar de trabalhadores-estudantes. Esses, muitas vezes, surpreendiam pelos bons resultados.
Foi a pensar nestes episódios que um dia destes lancei o repto sobre a Universidade Aberta. O Jorge Morais ainda não me respondeu, mas voltarei ao assunto. Mas porquê invocar a UA neste contexto? Porque, segundo sei, na UA não existem aulas presenciais e os alunos têm ao dispor manuais. Ora, na UA isso até pode ser compreensível, se o manual servir como guião de estudo. Deixa de o ser se o aluno não ler mais nenhuma obra. Mas o caso é mais grave no caso do ensino presencial, em que a maior parte dos alunos não são trabalhadores-estudantes. Não é aceitável que se conclua um curso lendo apenas apontamentos. Informação não é sinónimo de conhecimento: ler vários autores sobre o mesmo assunto é essencial para a construção de um espírito crítico, de análise e reflexão.
Mas será a responsabilidade só dos alunos? Não me parece. Os professores promovem esta situação ao darem um tom descritivo às suas aulas e, nos exames, colocarem questões que não obrigam à análise e conduzem à mera narração.